sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Jesus Cristo: único mediador segundo a Carta aos Hebreus

Aíla L. Pinheiro de Andrade*, nj.

“Aos hebreus” é o título do livro bíblico. Não menciona a região onde estavam as pessoas a quem se dirige, mas podemos encontrar, a partir do próprio texto, algumas pistas sobre seus primeiros destinatários.

Os membros da comunidade de Hebreus parecem estar em boas condições financeiras (Hb 10,34). Provavelmente não eram da Igreja de Jerusalém, cujas necessidades foram socorridas pela coleta dos irmãos gentios (At 24,17; Rm 15,26-28).

O texto deixa transparecer que seus primeiros destinatários estavam seriamente contaminados por uma crise de fé ou apatia (Hb 5,11b; 6,12; 12,3. 12), com dificuldade para perseverar (Hb 3,14) e com falta de confiança (Hb 10,35). Alguns tinham abandonado as assembléias (Hb 10,25) e a fé cristã (Hb 6,4-6; 10,28-31), embora o autor recorde que ainda jovem essa comunidade suportou um “combate pesado e doloroso” (Hb 10,32): injúrias, perseguições, espoliação dos bens (cf. Hb 10,33-35), alguns cristãos foram colocados na cadeia (Hb 13,3). Além disso, havia ainda o perigo de desvio doutrinário (Hb 13,9).

Enfim, o texto fala de dificuldades internas e externas da comunidade. Elogia, porém, seu passado, afirmando ser digno de louvor: seus membros serviram os “santos” (cf. Hb 6,10) e aceitaram os sofrimentos alegremente (Hb 10,34). Esses fatos do passado são lembrados agora para estimulá-los à perseverança. Portanto, não se trata de uma Igreja de fundação recente (Hb 5,12). O autor lhes recorda os pregadores, dos quais receberam o anúncio, como já tendo concluído suas carreiras naquele momento, ou seja, já estavam mortos (Hb 13,7). Mas apesar dessa comunidade ter aceitado o anúncio há muito tempo e de ter passado por esses sofrimentos, ainda não era capaz de tirar deles a força para manter-se fiel, e está sucumbindo a uma apatia da fé (Hb 5,11-14).

Diante das dificuldades internas e externas, o autor convida os destinatários a olharem para quem suportou o maior sofrimento de todos, Jesus Cristo, o “Sumo Sacerdote”, que se sentou à destra do trono da majestade nos céus” (Hb 8,1). Isso requer uma explicitação, visto que ele não era da estirpe sacerdotal, da tribo de Levi (Hb 7,14; 8,4).

O sacerdócio de Cristo não é segundo a descendência (carne), mas de outra forma. O autor encontra na tradição de Israel um argumento fundamental: Jesus foi feito Sumo Sacerdote segundo a condição (ordem) de Melquisedeque” (Hb 6,20; Sl 110,4).

Para Israel, sacerdócio significa mediação entre Deus e o povo. Sumo Sacerdote significa único mediador. E a partir do conceito de sacerdócio como mediação, o autor de Hebreus vai tecer suas considerações.

Para quem pensa que os anjos são mediadores, escreve o autor de Hebreus que Jesus é maior que os anjos, pois esses, embora estejam junto a Deus, não são humanos, e por isso não podem ser solidários com nossas fraquezas (cf. Hb 2,5-18).

Para quem venera a memória de Moisés, tido pelos judeus como o maior mediador (Nm 12,1-8) do qual os sacerdotes dependiam (Lv 8,12), o autor afirma em Hb 3,1-6 que Moisés não passa de um servidor, só Jesus, enquanto Filho, é digno de fé, constituído à direita de Deus (Hb 1,3).

Para ser verdadeiro mediador, há que pertencer às duas realidades: humana e divina. Moisés participa da esfera humana, conhece nossas fraquezas, mas é um servidor da casa e não o Filho. Os anjos têm acesso à esfera divina, pois estão diante do trono, mas não são humanos, logo, não são verdadeiros mediadores (1,4–2,5). Assim, somente Jesus Cristo é o único mediador, em outras palavras, o Sumo Sacerdote.

Por ser o Filho, ele tem a autoridade de ter sido constituído Sumo Sacerdote por Deus, glorificado à direita do Pai. Na relação com os homens há o aspecto da solidariedade: é misericordioso, visto que por experiência própria participou das nossas fraquezas (Hb 5,7, e na Cruz – Hb 12,2).

Isto faz dele o fundamento da nossa fé. O cristão pode lançar toda a sua existência sobre esse fundamento, por duas razões: porque Cristo é o Filho de Deus constituído em dignidade; e porque nos amou a ponto de morrer por nós.

* Aíla L. Pinheiro de Andrade é membro do Instituto Religioso Nova Jerusalém. Graduada em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), onde também cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica. Leciona na Faculdade Católica de Fortaleza e em diversas outras faculdades de Teologia e centros de formação pastoral.

Um comentário:

Peregrino disse...

Olá Aíla! Sou Mauricio, jesuíta do Equador que foi aluno seu. Parabéns pelo Blog de seu instituto! Acho um grande instrumento evangelizador...
Convido também olhar o meu blog de relatos http://relatosdeunperegrino.blogspot.com/
Abraço!