domingo, 22 de agosto de 2010

O ESPÍRITO SANTO NO ANTIGO TESTAMENTO

Aíla L. Pinheiro de Andrade*, nj.

A compreensão neotestamentária sobre a atuação do Espírito Santo na vida cristã foi herdada da tradição veterotestamentária e da tradição apostólica sobre Jesus de Nazaré, sua vida e suas palavras.
A expressão “Espírito de Deus” ou “Espírito Santo” encontra-se na maioria dos livros da Bíblia. Mas, no Antigo Testamento (AT), a expressão hebraica Ruah ha-Kodesh, referindo-se unicamente ao Espírito Santo, somente é encontrada no Sl 51,13 e Is 63,10. Ruah significa “respiração”, “vento” ou “brisa” e ha-Kodesh significa “do Santo”, ou seja, “de Deus”. Essa expressão é apenas um sinônimo de Deus ou da profecia por inspiração divina. Ruah ha-Kodesh também pode ser identificada com a Presença Divina na nuvem que guiava o povo no deserto e que pairava sobre a Tenda do Encontro no acampamento israelita (Nm 9,15-17).
Os autores bíblicos não filosofaram sobre a natureza divina, mas pensaram o Espírito Santo atuante. E, não obstante observemos uma identificação entre Deus e o Espírito Santo, também há uma clara distinção entre ambos. Mesmo que o pensamento monoteísta de Israel não lhe permitisse a noção de Trindade, há numerosas passagens no AT que estão em harmonia com a concepção trinitária e preparam o caminho para esta doutrina, como o Sl 139,7; Is 63,10; 48,16; Ag 2,5; Zc 4,6. A identificação é vista, principalmente, no Sl 139,7 (que declara a onipresença do Espírito), em Is 63,10 e Ez 36,27. Em um grande número, porém, de passagens, Deus e o Espírito Santo são distintos como, por exemplo, Gn 1,2; 6,3; Ne 9,20; Sl 51,13; 104,29s. Mas isso não significa que, no pensamento dos autores do AT, Deus e o Espírito Santo fossem considerados como dois seres distintos. A distinção entre ambos significa apenas que o Espírito Santo tinha funções que eram próprias dele. O Espírito Santo expressava a ação de Deus, particularmente quando uma ação humana caracterizava-se como efetivação de algum propósito divino. O Espírito significava, então, a ação de Deus imanente no ser humano e no mundo. Era Deus agindo dentro do ser humano e, ao mesmo tempo, enviado por Deus ao ser humano.
Os autores do AT consideraram os fenômenos da natureza como sendo o resultado da ação direta de Deus através do Espírito. Para o AT, é pelo Espírito que a vida é dada, mantida e redimida. A manifestação mais distintiva e importante da atividade do Espírito no AT está na esfera da profecia. O profeta era essencialmente distinto das demais pessoas como alguém que possuía o Espírito de Deus, enquanto os iníquos o tinham por louco (Os 9,7). Mensageiro de Deus, o profeta proclamava a mensagem divina através do Espírito que agia nele.
Em algumas passagens do AT o Espírito Santo é chamado de “bom” (Ne 9,20; Sl 143,10), principalmente porque ensina a fazer a vontade de Deus (Sl 143,10). Essas afirmações apontam para uma qualidade ética da ação do Espírito Santo. Mas é no Messias que a ação do Espírito Santo agirá de maneira especial, segundo a teologia do AT. O termo “messias” significa “ungido (de Deus)”. Nele o Espírito atuará de modo único, dotando-o com poder e sabedoria (Is 11,1-5) para a obra com a qual trará o reino de justiça e paz. Em Is 42,1ss o “Servo” é dotado do Espírito para promulgar o direito aos gentios. Em Is 61,1ss encontramos as notáveis palavras citadas por Jesus em Lc 4,18s: “O Espírito do Senhor está sobre mim...”.
Ao longo da história de Israel, quando os sofrimentos do exílio fizeram-se sentir pesadamente, surgiu uma tendência de idealizar uma era futura como a era da bênção especial do Espírito, marcada por um forte otimismo sobre um derramamento futuro do Espírito, como em Jl 3,1-5, citado em At 2,17-21.

Bibliografia:
CLARK, Matityahu. Etymological dictionary of Biblical Hebrew: based on the commentaries of Rabbi Samson Raphael Hirsch. Jerusalem & New York: Feldheim Publishers, 1999.

* Aíla L. Pinheiro de Andrade é membro do Instituto Religioso Nova Jerusalém. Graduada em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), onde também cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica. Leciona na Faculdade Católica de Fortaleza e em diversas outras faculdades de Teologia e centros de formação pastoral.

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