terça-feira, 30 de junho de 2020

“Na cátedra de Moisés estão sentados os escribas e fariseus” (Mt 23, 2)

Sob o altar da cruz muitos de nós, batizados, que recebemos o dom do Espírito, julgamos o mundo... Quantas vezes esquecemos aquele por quem de fato o mundo será julgado... Esquecemos que diante da cruz já não há culpas nem culpados, mas amor do Amado. Junto da cruz de Jesus, o trono do “Rei dos Judeus”, e isto é interessante, junto da cruz: caminham os bons e os maus, caminham aqueles que aceitam sua graça e aqueles que a recusam, recusam a mercê do Juiz.

A Aqui a Lei de Moisés, paradoxalmente encontra sua plena consumação, não mais em tábuas de pedra, mas no coração da carne humana. “Portanto, tudo o que eles vos disserem, fazei e observai, mas não imiteis as suas ações, pois eles falam e não fazem” (Mt, 23, 3). Quantos de nós, juntos a cruz de Jesus escarnecemos do seu sofrimento. Mas, ainda hoje poderíamos fazer isso? O Senhor é já ressuscitado, está junto do Pai, como escarnecemos de seu sofrimento, se já não sofre? “[...] todas as vezes que fizeste a um destes mínimos que são meus irmãos, a mim o fizestes” (Mt 25, 40).

Ora, o que ensinamos com a boca e não vivemos com a vida é o que testemunha contra nós e seria, de fato, muita ingenuidade, talvez vã ousadia, achar que os pecados daqueles que estão sobre nossas cátedras não são os nossos. Afinal, não por causa de uns, mas pelos crimes de todo o povo ele deu sua vida (cf. Is 53, 4-5; Jo 11, 50). Pecamos, quando levamos à banca rota a Palavra pelo falso testemunho de nossa vida, pois a Palavra de Deus é vida, cria e recria a vida. Pecamos, quando somos cegos, surdos e mudos diante dos crimes e pecados dos nossos semelhantes.

Os “sete ais” de Jesus contra escribas e fariseus não se devem levar contra todos os escribas e fariseus, mas “Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas” (Mt 23, 13). Ai de nós, católicos, ai de nós cristãos, e com peso maior, ai de nós batizados, que recebemos o Espírito e julgamos enganar a Deus com nossas hipocrisias, julgando agradar o mundo em uma vida diferente daquele é Cristo e Senhor.

Oramos, pedimos, fazemos ofertas e procissões, mas não somos atendidos, porque não oramos como convém (cf. Is 1, 10-20). Oramos com nossa vida longe do Espírito de Jesus, uma vida que anda na contramão, que não é possível simplesmente defini-la com palavras porque desconcerta o mundo em todos os lados, é inefável para o rico e para o pobre, para o homem e para a mulher, para o escravo e o livre, para o judeu e para o grego. Mesmo assim, de todos nós faz um só (cf. Gl 3, 26-29). Somente o Espírito em nós sabe orar como convém (cf. Rm 8, 26-27).

Ai de nós, remidos no sangue do Cordeiro, porque dele prestaremos contas! Ai de nós, cristãos católicos, primícias do povo novo, que percorremos terra, mar e redes virtuais, para converter corações à divisão de nossas confusões e esquecemos que um só é o Senhor. Entorpecemos a fé e dela fazemos barganha, pendendo para a esquerda, pendendo para a direita, nos iludindo com um centro que não é equilíbrio nem ordem, mas indecisão! Ai de nós que pomos a nossa fé não no Deus de nossa Casa, que é o Santuário interior do homem, mas nos dons, nas virtudes, nos bens passageiros... Adoramos a criatura no lugar do Criador. Buscamos nossos interesses e não os de Jesus Cristo (cf. Ef 2, 21).

Quantas vezes, somos tão fies à “Lei de Moisés” e esquecemos o culto verdadeiro ao Deus de Moisés, que libertou seu povo, que o tirou da casa do aperto, para lhes dar uma terra espaçosa. Quantas vezes, e ai de nós, que adoramos a lei que vivemos em nossas carnes e matamos a Esperança que a criatividade do Espírito faz surgir em tantos corações. Construímos túmulos para os profetas, festejamos os santos do passado e matamos aqueles que Deus envia à nossa geração (cf. Mt 23, 29ss). Se quisermos fazer a diferença, e podemos fazer, olhemos para Deus, se não pudermos contemplá-lo tal qual ele é, contemplemo-lo onde se deixa encontrar.

Olhemos dentro de nós, o Deus que nos criou, criou a vida ao nosso redor. Criou a vida independente de quem a esteja vivendo. Ai de nós, que enfeitamos nossas procissões, que ornamos nossas cruzes e proclamamos a ressurreição, mas permanecemos mortos e, como cemitérios limpos, enterramos a vida de tantos dentro de nossos corações. Mas, ainda agora, “é tempo de ser Igreja, caminhar juntos, participar”.



João Paulo Lima Cordeiro, aluno do 3º. ano, bacharelado em teologia da Faculdade Católica de Fortaleza, atividade para a matéria Evangelho segundo Mateus (Profa. Aíla Pinheiro, nj).

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