Roteiro Homilético para o XIV Domingo Comum – B (8 de julho)
Aíla L. Pinheiro de Andrade, nj *
(Texto publicado originalmente em Revista Vida Pastoral ano 53 - número 285, julho-agosto de 2012).
(Texto publicado originalmente em Revista Vida Pastoral ano 53 - número 285, julho-agosto de 2012).
O tema da liturgia de hoje é a rejeição à palavra de Deus.
No evangelho, os contemporâneos de Jesus não lhe dão crédito porque não
conseguem ver nele nada mais que um carpinteiro. Mas isso não é fato pontual,
já havia incredulidade no tempo dos profetas. A primeira leitura menciona a
falta de fé dos contemporâneos de Ezequiel, porque têm um coração insensível. O
profeta é orientado a insistir na proclamação da palavra de Deus mesmo que seus
contemporâneos não queiram ouvi-la. Assim também agiu Paulo, que, em vez de
desanimar com as dificuldades, continuou com o anúncio do evangelho e nos
ensinou a dizer: “quando sou fraco, então é que sou forte”.
II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS
1. Evangelho (Mc
6,1-6): O profeta é desprezado na própria terra
Passando novamente por sua própria terra, Jesus encontrou
dificuldade para operar milagres por causa da falta de fé. Ele se dirigiu à
sinagoga no dia de sábado, como todo judeu adulto, e tomou a palavra para
ensinar. Não se tratava de qualquer instrução, pois o lugar e o dia faziam
disso um ensino oficial e litúrgico.
O ensino de Jesus causa duas reações contrárias: admiração e
recusa. Essa disposição para com Jesus marca todo o Evangelho de Marcos, tendo
como principais protagonistas dessa recusa os líderes religiosos de seu próprio
povo, Israel.
A admiração diante do ensinamento de Jesus estava
relacionada com sua autoridade, que não vinha de sua profissão. Ele não tinha a
profissão de Rabino (mestre), mas de artesão da madeira. O fato de ser
carpinteiro não era desonra, pois se tratava de profissão bem considerada. Essa
afirmação apenas prova que os seus compatriotas o conheciam bem e se admiravam
que fosse sábio e fizesse milagres, quando o normal seria apenas trabalhar com
a madeira. O objetivo aqui é mostrar que a sabedoria e o poder de Jesus não vêm
das pessoas, não se adquirem como uma profissão, mas vêm de Deus.
Em seguida, a admiração inicial transformou-se em
hostilidade, sinal da incredulidade ante as obras de Jesus. O episódio retrata
que os galileus estavam marcados pelo preconceito: admiravam as obras de Jesus,
mas não o acolheram. Essa falta de acolhimento o impossibilitou de fazer
milagres em sua própria terra, uma vez que os milagres significavam o avanço do
reino de Deus e o retrocesso do antirreino, e isso só era possível onde havia
fé em Jesus como Messias/Cristo. O preconceito fechou os corações, e os
galileus não perceberam a ação de Deus em Jesus.
2. I leitura (Ez
2,2-5): O profeta anuncia, quer escutem, quer não
O texto diz que o sopro de Deus entrou em Ezequiel: isso
significa que agora ele é inspirado e movido pelo dom da profecia e o que vai
anunciar é palavra de Deus. O Espírito põe o profeta de pé, em atitude de
prontidão, para anunciar ao povo a profecia que vai receber.
Ezequiel é enviado aos filhos de Israel. Algo fora do comum
acontece no v. 3: em vez de Israel ser chamado “povo de Deus”, como geralmente
acontece na Bíblia, é chamado de “nação rebelde”, literalmente “gentio
rebelde”. Na Bíblia, “gentio” está sempre em oposição a Israel, que é sempre
referido como “o povo”. Isso significa que, quando Israel rejeita a palavra de
Deus, se torna igual aos gentios.
A rebeldia dos contemporâneos de Ezequiel vinha de longa
data, as gerações passadas se comportaram da mesma forma. As perspectivas da
recepção da profecia por parte dos destinatários não são nada animadoras para
Ezequiel, pois eles têm a face endurecida e o coração obstinado. Quer escutem,
quer não, saberão que “houve um profeta entre eles”. Essa expressão significa
que Deus é misericordioso e os advertiu, e que eles já não têm desculpas para o
erro.
3. II leitura (2Cor
12,7-10): Prefiro gloriar-me de minhas fraquezas
Paulo afirma que tem um “espinho na carne”; de maneira
geral, essa expressão significa algo que provoca grande angústia. Uma alusão a
Ez 28,24, quando se refere aos povos vizinhos (e inimigos) de Israel como
espinhos e abrolhos. Com a expressão “espinho na carne”, o apóstolo pode estar
se referindo, entre outras coisas, às angústias que tinha suportado com a
oposição à sua pessoa, e à sua autoridade, por parte dos coríntios. A rebeldia
da comunidade de Corinto contra Paulo foi tão dolorosa que o compeliu a
escrever uma “carta entre lágrimas”: “foi levado por grande aflição e angústias
de coração que vos escrevi, em meio a muitas lágrimas” (2Cor 2,4).
A expressão “mensageiro de satanás” é equivalente a “espinho
na carne” e significa que, mesmo sofrendo rejeição por parte dos coríntios, o
apóstolo não desanimou da missão de exortá-los a viver conforme o evangelho.
Paulo aceitou as angústias como uma motivação para exercer a humildade e vencer
o orgulho. O apóstolo deixou que Deus se utilizasse da fraqueza humana para
mostrar a grandeza do agir divino.
III. PISTAS PARA
REFLEXÃO
A homilia deve levar a comunidade a refletir sobre as graves
consequências da rejeição à palavra de Deus. Ainda hoje Deus nos fala por meio
de pessoas humildes e modestas. Às vezes a palavra que nos é anunciada
questiona nosso agir, e por isso é muito mais fácil rejeitá-la que sair do
nosso estado de comodismo ou de pecado. Não raro nos tornamos um espinho na
carne, não raro provocamos grandes angústias a quem somente deseja o bem da
comunidade e a vivência mais autêntica da mensagem de Jesus.
* Aíla L. Pinheiro de Andrade é graduada em Filosofia pela Universidade
Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia
(Faje), onde também cursou mestrado e doutorado em Teologia Bíblica e lecionou
por alguns anos. Atualmente leciona na Faculdade Católica de Fortaleza e em
diversas outras faculdades de Teologia e centros de formação pastoral.
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